Associo-me parcialmente à apreciação do nobre
Pinpin envolvendo a já polêmica novela global, sobre pano de fundo do Exército e
da Cavalaria. Acrescentaria que o sereno, oportuno e esclarecedor discurso do Sr
B. do Milênio alinha-se na melhor tradição de alteregos dinásticos Bac, da
qual a extração São Jorge derrapou nas carrapetas de modo nunca dantes
registrado na história do egrégio Esquadrão. Atribuo o deslize a certos
mecanismos ocultos da natureza humana, diabinhos adormecidos vez ou outra
despertos, a nos infligir o exotismo de comportamentos alheados de nossas
personalidades e daquilo que na verdade somos.
Qual de nós, com sinceridade modelar,
assegura estar infenso de fato aos desvãos traiçoeiros da própria psique, mesmo
na idade provecta que célere se aproxima para a Nação72? Quem não carrega algum
pequeno desatino cometido ao longo da vida, algum desejo inconfessável abrigado a sete
chaves no inconsciente, ou pensamento censurável assustadoramente replicado na
mente? Daqui lanço o repto, e recorrendo ao processo catártico deflagrado pelo
insigne confrade Boita nas animadas tertúlias mensais do CMPV, revelarei segredo
pessoal há mais de trinta anos só compartilhado junto a queridíssimo irmão de
Arma, de quem preservarei o anonimato e ao qual rogo perdão antecipado pelo
rompimento público de autêntico pacto de honra assumido.
Corria o ano de 1978. Solteiro convicto,
instrutor do CPOR-RJ, à época bem remunerado, noites invariavelmente livres para
desfrutar a sedutora urbe carioca de então, quedei ante o dilema proustiano da
busca do tempo perdido. Era o início de uma breve saga capaz de conduzir-me a
vôos impensáveis, transportado nas asas do puro surrealismo: resolvi estudar
para o concurso do IME. Sim, o Instituto Militar de Engenharia, a veneranda casa
das ciências exatas no EB, onde minhas escassas aptidões poderiam em hipótese
otimista catapultar-me ao patamar superior de cabo-da-guarda permanente da
imponente edificação da Praia Vermelha, sede do Instituto. Enfim, decisão
tomada, matriculei-me em horário noturno na filial Castelo do prestigiado Curso
Bahiense, lá comparecendo para o batente embalado nos anseios e expectativas
dignas de pré-vestibulando entusiasmado.
Primeiro dia de aula. Em meio ao burburinho
inaugural dos alunos no saguão do Curso, alguns deles já conhecidos entre si de
longa data, comecei a pressentir-me desajustado diante daquelas circunstâncias
inéditas, verdadeiro estranho no ninho, pois o perfil dos novos colegas longe se
assemelhava ao deste narrador. Mais jovens na esmagadora maioria, suas
aparências não desmereciam a realidade logo comprovada de serem rematados
cedeefes, nerds, gagás ou adjetivações similares. Alea jacta est, pensei,
remexendo o baú dos meus parcos conhecimentos de História; alma cavalariana
heróica e forte, para a frente, para a glória, para a morte, seja o que Deus
quiser, recuar... jamais!!! Prenhe de coragem kamikaze, decidi permanecer e
enfrentar a toca de leões do Cálculo
Infinitesimal, da Física pré-quântica, da Química pós-orgânica, das intrincadas
derivações matemáticas e quejandos.
Primeiro tempo de aula findo, a custo
inaudito esforçava-me por manter alguma dignidade interior, laivos de alento que
me impeliriam a continuar fustigando os inamovíveis dragões de crassa
incapacitação intelectual própria. Quem sabe, imaginara no fundo da sala,
pudesse eu vir a ser contemplado por especial insight divinal a consagrar-me expoente da Engenharia Militar? Sem dúvida,
possibilidade remotíssima, ao menos nesta encarnação, porém factível ao
pensamento mágico do jovem tenente da Arma Ligeira, sonhador, ávido pela glória
de feitos épicos inerentes aos missionários das lanças cruzadas. Absorto em
conjecturas absurdamente irreais, curti o intervalo e ret ornei para o segundo
tempo.
Aula reiniciada havia poucos segundos,
adentra o recinto, pela porta principal, personagem singular, num rompante
inesquecível que guardarei na retina até o final dos tempos. Quando o vi,
naquele átimo, acreditei piamente em duendes, nas crendices populares das
culturas regionais e universais, nos dogmatismos religiosos, na metafísica, nas
manifestações da espiritualidade, no devir filosófico, nos arroubos invisíveis
do destino, no silêncio do Boca e em quaisquer outras explicações implausíveis à
razão. A aura de sua presença equiparava-se à do Messias redivivo nas
dependências do Bahiense Castelo. Aleluia, hosana, rá, hurrah, evoé, salve,
valeu, acho ter bradado algumas ou
enfileirado estas saudaçõ es em sequência, tamanho era o sentimento misto de
surpresa, estupefação e alegria de que fui acometido ao constatar a proximidade
do colega inesperado, um irmão cavalariano da Turma, sábio, filosófico, cultor
da alta equitação, estudioso dos blindados, líder carismático, destemido, amigo
exemplar, escritor ilustrado, pensador aguçado, enciclopedista admirado,
personalidade sem jaça. Na essência, viajante cósmico de peculiar envergadura,
também aspirante ao IME.
Se enorme foi meu sobressalto, inenarrável
decerto seria o do companheiro fraterno ao reconhecer-me naquele local. Embora
sobretudo movidos pelo estimulante desafio de superar determinadas dificuldades
funcionais, eu no CPOR, ele em curso de especialização há pouco iniciado, nossas
perspectivas de sucesso num possível concurso eram diametralmente opostas, dada
a abissal diferença intelectual entre nós. Mal comparando, diria possuir o meu
amigo neurônios padrão quatro estrelas, restando a mim o beneplácito sináptico
de cabo das baias. Reatamos contato interrompido desde o Aspirantado, e a cada
noite encarávamos o cipoal de fórmulas matemáticas apresentado nas aulas como se
fosse muro de pedra de dois metros de altura e cinco de frente a ser ultrapa
ssado numa carrière, ele montado num cavalo puro-sangue, eu num pangaré recém
liberto da Seção Veterinária.
Autênticos velhos camaradas, tal qual os
versos do Cordeirinho, vasto era o nosso rol de interesses abordados no Curso.
Logo nos primeiros dias o meu interlocutor, a quem denominarei DS, expôs
argumento até então imperceptível à minha proverbial ausência de perspicácia.
Ponderava o amigo que nossa pretensão de matrícula no IME e a frequência ao
Bahiense deveriam ser sigilosas, pois se difundidas no EB nos acarretariam o
anátema de tenentes relapsos perante as atribuições da Arma, principalmente para
ele na condição de aluno em fase de especialização, extremamente dependente de rigorosas avaliações de conduta,
expressas no fantasma do conceito vertical. Compreendi a preocupação e ali
selamos o compr omisso de segredo tumular sobre nossas intenções estudantis e os
preparativos noturnos no Curso. Tive sobrevida de uns três meses nas aulas, ele
um pouco mais, e doravante jamais alguém se referiu à nossa exótica e tímida
pretensão de ingresso no IME, em clara comprovação de sucesso do pacto de sigilo
firmado. Ali, inexorável, findava o nascituro Dom Obá QEM, alterego idealizado
cuja existência não se consumou.
Reafirmo minhas escusas ao antigo colega do
Bahiense, que certamente entenderá as razões da revelação do nosso pacto,
contextualizada no debate provocado pelas fanfarronices do arrivista Bac do São
Jorge, ao qual desferi pontapé intencional nas partes baixas, profundamente
indignado com o seu adesismo aos poderosos de plantão; suponho ter acusado o
golpe e permanecer fora de combate, pois recorreu aos préstimos de outro
alterego da sua dinastia, Bac do Milênio, para desdizer-se e tentar justificar o
vão palavrório originalmente postado na rede da TuMMM.
Incluí Bac do São Jorge na subcategoria dos
trânsfugas existenciais, pois flagrado em falta grave escafedeu-se a buscar
apoio no próprio chefe do clã, Dom Bernardes, de quem deriva a renomada família
de alteregos Bac. O estilo irrepreensível, a lógica e o descortino da
argumentação, em contraponto ao meu brado lancinante valorizado pelas
intervenções de confrades ilustres, denunciam a pena inconfundível de Dom
Bernardes, cuja inteligência e pureza d’alma não são passíveis de
questionamentos. E neste ponto discordo do Prez Pinpin, quando ironiza o talento
literário de Bac do Milênio, sob a atenuante de que não deve ter percebido a
intervenção pressurosa de Dom Bernardes, para minorar os estragos causados pelas
lamentáveis demonstrações de jactância proporcionadas pelo tal B. do São Jorge
na mensagem inicial da polêmica virtual.
Malgrado o elogiável tom elucidativo de Bac
do Milênio, leia-se Dom Bernardes, parece consensual que a anunciada novela
oferece mais riscos do que vantagens à imagem institucional da Força, entre
diferentes motivos devido ao fato de ser uma “obra aberta”, ao bel prazer da
autora, e à longuíssima duração, superior a duzentos capítulos. Valho-me da observação magistral do Barão de
Vargem Grande, em caso de IBOPE rastejante, para apimentar o folhetim e
alavancar a assistência televisiva, ávida por vulgaridades de impacto: o capitão
Cav Theo assumir a paixão pelo cabo Simão, num afetuoso beijo lingual ao vivo e
a cores em rede nacional.
De tudo, há o consolo da ação meritória de
Bac do Milênio, alerta e atento para impedir, ou amenizar, exageros letais ao EB
e ao Esquadrão imortal. Vamos torcer,
vamos cobrar...
Ao concluir, externo duas sugestões a
inquietar-me nesta manhã comemorativa do Dia do Soldado, quando nossos corações
em festa revitalizam-se nas recordações de uma vida forjada na grandeza de ideal
apenas dimensionado na alma dos homens e mulheres realmente vocacionados para a
carreira das armas.
A exemplo do embrionário Dom Obá QEM, seja o
alterego Bac do São Jorge remetido sem volta ao lixão da história. Sua aparição
relâmpago não suscitará saudade ou manifestações lacrimosas, à exceção talvez da
autora da novela.
Alfim, considerada a inteligência, o talento
multidisciplinar, a verve, o perfil escorreito e a integridade do personagem,
estou a enviar neste momento à presidência da TV Globo proposta no sentido de
substituição do atual diretor-geral de novelas da emissora. A referida proposta
sugere assumir o cargo nosso confrade Bac do Milênio, e se intitula: CHEGA DE INTERMEDIÁRIOS...
Rio,
25 de agosto de 2012
Dom
Obá III, politicamente incorreto e sinceramente correto.com
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