Tenho recebido reiteradas mensagens a respeito de Termo de Ajuste
celebrado entre o Estado Brasileiro e a Corte de Direitos Humanos da OEA,
determinando colocação de placa na AMAN para registro nominal de cadete falecido
em atividade de instrução, acompanhadas críticas acerbas, sobretudo quanto à
ingerência alienígena atentatória à nossa soberania.
A
legitimidade e abrangência do Judiciário, na plenitude suas destinações
constitucionais, expressa conjuntura interna de indiscutível normalidade para
dirimir contenciosos segundo a legislação processual brasileira,
dispensando-se justificativa plausível
de recurso à arbitragem externa, demeritória de pressupostos essenciais da
cidadania quando estabelece o aviltamento internacional de instituições
basilares do chamado ordenamento democrático. Acrescido o fato de o processo
motivador do mencionado Termo ter transitado em julgado no Brasil, com exaustiva
apreciação de seus desdobramentos legais, incluindo efetivação de direitos, a
sentença da OEA, visivelmente ideologizada, denota abe rração jurídica cuja
finalidade precípua aparenta ser a de denegrir o Exército. Empregando o disfarce
da reparação humanitária, magistrados capciosos recendem ressentimentos e
preconceitos ancorados em inequívoca matriz
político-ideológica.
Do episódio, lições devem ser extraídas. Sob o olhar da maturidade
profissional, a morte de um companheiro de farda, especialmente de forma
trágica, provoca sentimento de irreparável luto e tristeza. Na AMAN, onde
amizade e companheirismo são corolários naturais da intensa e integradora rotina
escolar, a perda de um colega se compara à de ente familiar querido,
transformada em dolorosa lembrança que jamais a memória dilui. Reverbera para
sempre, sendo apenas suscetível de compreensão integral aos que algum dia foram
cadetes, vivenciando as alegrias, tristezas e conquistas de uma juventude
marcada pela superação de enormes desafios. Na convivência diária das salas de
aula, dos exercícios no terreno, dos
parques e das pequenas distrações, são forjados liames amistosos indestrutíveis;
o desaparecimento de qualquer integrante dessa comunidade peculiar, ainda mais
se no decorrer do curso de formação, representa choque emocional que a todos
abala, deixando sequelas nos corações e mentes infinitamente superiores ao
simbolismo de eventuais registros materiais. A saudade, o respeito e a estima
dos companheiros expressam a mais
legítima e duradoura homenagem aos que sofreram o infortúnio do óbito precoce.
Dos riscos intrínsecos à carreira até fatores imponderáveis, por vezes
agentes de fatalidades, percebe-se amplo
leque de possibilidades passível de enquadrar as causas de acidentes graves em
atividades militares. Sejam humanas, materiais ou de natureza diversa cabe
identificá-las e analisá-las à exaustão, produzindo atitudes corretivas que lhes
bloqueiem a reincidência nefasta; para isso, no mínimo, as conclusões das
investigações de acidentes com baixas humanas deveriam ser disseminadas junto ao
público interno e aproveitadas no sentido de realimentar o conteúdo de manuais,
diretrizes e normas instrucionais. Sou
de opinião que preservada a p rivacidade de determinados aspectos, se assim
imprescindível, utilizar o método pedagógico de estudos de casos, além de
potencializar absorção de valiosos ensinamentos, conferiria melhor percepção de
realidade ao imperativo da segurança. Aguçar o conhecimento das origens de
acidentes visando a eliminá-los requer sistematização de procedimentos, em que
propagar lições aprendidas aos diferentes níveis hierárquicos, dinamizar a
extensa rede de instrumentos e meios de comunicação disponível, atribuir rigor
máximo à obediência de preceitos normativos, e sobretudo aumentar a
conscientização sobre as responsabilidades individuais de caráter preventivo
devem ascender a metas
prioritárias.
Educar, prevenir, analisar, corrigir, responsabilizar, eis alguns verbos
capazes de orientar a operacionalização de iniciativas contra a perda de vidas
humanas em serviço, ocorrência anormal e indesejada. À afirmação óbvia de que medidas posteriores aos
acontecimentos infaustos não ressuscitarão os vitimados, nem diminuirão a
consternação de pais, familiares, amigos e pessoas próximas, agrega-se a
constatação de eximir-se da tradição de nossas Escolas e Unidades, pelo menos de modo sistemático, a exposição de
registros visíveis sobre falecidos em atividades da OM. E aqui enfatizo proposta
digna de atenção, particularmente nas escolas m ilitares: coloquem-se marcos
evocativos aos mortos em tais circunstâncias, seja mediante placas, designação
de logradouros, dependências ou instalações apropriadas, o que aliás careceria
de ineditismo na esfera das Forças Armadas, observada por exemplo a antiga
existência, na Academia da Força Aérea Brasileira, de memorial aos cadetes
obituados na instrução de vôo.
Objeções certamente hão de surgir, que imagino do tipo – e se a vítima
provocou o acidente fatal ?... - e se foi imperita, imprudente e negligente?...
- e nas hipóteses de suicídio, ou motivação criminosa?...
A estes argumentos, embora lógicos e pertinentes, além de correlatos a
serem acrescidos, julgo sobrepor-se a razão dramática e definitiva do sacrifício
de jovens em sua quase totalidade, cujas mortes traduzem infindável martírio aos
pais e parentes próximos, gerando consequências desastrosas, indeléveis e
abrangentes. Sobreleva o fator humano, diante do qual todos os demais
apequenam-se e tornam-se subalternos, cabendo à Instituição dimensioná-lo a
favor da justiça em patamar de insuperável importância. Afinal, nenhum pai ou
mãe, em sã consciência presume que filho
seu venha a falecer no curso de qualquer atividade no interior de uma
respeitável escola militar, em especial na AMAN. A meu ver, desconsiderados os
fatores determinantes dos acidentes e suas consequências, a perpetuação dos
nomes das vítimas nas instalações escolares simbolizaria justa homenagem e
lembrança enfática das precauções de segurança no ambiente dos
quartéis.
Evidências insofismáveis descaracterizam o aludido Termo de Ajuste como
instrumento de justiça isento e fidedigno. Respeitada inquestionável e
imperecível dor, até mesmo compreendida a revolta de representantes do falecido cadete, o
processo enveredou por caminhos alheios aos ditames exclusivamente jurídicos,
vindo a oportunizar interesses político-ideológicos de notória extração. Em
contrapartida, julgo que o assunto deva merecer reflexão institucional a
propósito da materialização de preito evocativo aos cadetes falecidos durante o
curso da AMAN, em atos de serviço; a medida, se efetivada, corresponderia a
gesto de grandeza, desarmando espíritos para o melhor esclarecimento de fat os
muitas vezes controversos, ressaltando, da Instituição, o respeito eterno por
jovens cujas vidas e aspirações foram bruscamente interrompidas.
Certamente a programação dos 40 anos de oficialato da Tu MMM 72
reserva espaço aos nossos companheiros falecidos na Academia. Encaminho à
Comissão Organizadora a sugestão de que submeta ao Comando da AMAN o plantio de
árvores, aposição de placa, designação de locais ou qualquer outra providência
materializadora da reverência eterna da Turma àqueles saudosos amigos tombados
no cumprimento de suas obrigações militares. Assim, talvez possamos contribuir
para a implantação de uma tradição mais cordial, capaz de melhor alertar às
novas gerações de instrutores, monitores e cadetes o quanto são responsáveis
pela eliminação de acidentes fatais na instrução, um lamentável desperdício de
vidas.
Rio, 23 de
junho de 2012
Cadete Cav
1039/72, Nilo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário