sábado, 26 de maio de 2012

40 ANOS, PRESENTE!!! A FORÇA DE UM IDEAL.


O coração tem suas razões, que a própria razão desconhece. A célebre frase de Blaise Pascal (1623-1662), importante matemático, físico, teólogo, filósofo e pensador francês ainda enseja interpretações, quase quatro séculos após registrada em Pensées, livro da fase terminal de vida do gênio seiscentista, à época já privilegiando os questionamentos filosóficos em detrimento dos científicos. Desta escolha existencial certamente sobreveio inspiração a eclodir na sentença imortal, válida como brevíssimo e definitivo tratado da inefável interrelação, lógica vs emoção.
Associados e não excludentes, analisem-se os desígnios do coração e da mente, pois sempre persistirá diminuto resíduo racional nas relações afetivas, mesmo nas paixões acaloradas e avassaladoras, expondo lógica invisível difícil de ser equacionada. E vice-versa, nas questões onde a razão transparece a preponderar, soberana. Se Pascal não tivesse sucumbido ao estudo de questões metafísicas, no trecho final de sua fulgurantemente curta existência, talvez a frase inaugural destas considerações jamais tivesse sido proferida.
Neste 2012, dedicado a justos festejos pelas quatro décadas de oficialato da gloriosa Turma Marechal Mascarenhas de Moraes, pressente-se indisfarçável conjunção astral propícia a satisfazer quimeras e sonhos, antes nunca visível. Cito exemplo próprio. Desde a irrupção do ano, impulsionado por súbita e indizível compulsão redacional, ouso difundir aos confrades maus poemetos, reles ensaios, banais croniquetas e discutíveis artigos de vasta miscelânea temática, habitualmente apreciada pela maioria sob ótica de generosa benevolência e até de incentivo a novas estripulias, que admito em circunstâncias outras impossíveis de serem imaginadas, ou digeridas.
Os indícios são veementes. Além dos tradicionais, intensifica-se o surgimento, ou reativação de núcleos associativos na imensidão do País, embalados no mote genial “onde houver ½ cadete de 72, lá estará o espírito da Turma”. O sítio eletrônico www.tummm72.com.br, alçou vôo solo a altitudes estratosféricas, consolidou-se como portal de notícias, intercâmbio de informações e contatos no universo da Nação 72, dando margem a retomar-se amizades de longa data apartadas. Há dias, ao questionar a reiterada ausência de confrade às assembleias aqui no Rio, embora trabalhe no entorno da Praia Vermelha, justificou-se ele de imediato assegurando que “nos encontraremos em Resende, no fim do ano”. Quer dizer, o companheiro esnoba, ou não consegue adentrar o CMPV, mas sem dúvida comparecerá ao PTM em dezembro, sobretudo, digo eu, encantado pela magia insuperável da casa-matriz de nossos sonhos da juventude: a Academia Militar das Agulhas Negras.
E exatamente à nossa estimada AMAN dedico este arroubo textual despretensioso e sincero. Meca de peregrinações periódicas, mesmo daqueles que por uma simples jornada nela abrigaram nobres ideais da juventude, exerce sobre os especiais rebentos de suas gerações e turmas fascínio singular, revitalizado em cada retorno ao santuário indestrutível. Nada há que supere nos corações de seus ex-inquilinos a emoção de reencontrá-la, na revivência de expectativas felizes marcadas pelo convívio fraterno de amigos ali para sempre conquistados. Julgo, portanto razoável esteja a aproximação do 16 de dezembro a provocar peculiar taquicardia na Turma, principalmente motivada por lembranças recorrentes e tudo nelas simbolizado. No entanto, a Academia, uma de nossas lídimas razões do coração, também nos consagra afetos derivados da razão. Ao refletir, intento externar alguns deles.
A criação da AMAN, é sabido, teve fulcro no idealismo, devotamento missionário e visão estratégica de ser humano formidável: o Marechal José Pessôa Cavalcanti de Albuquerque. Sem ele, seu pioneirismo, liderança e amor ao Exército, a história da formação dos oficiais da Força Terrestre, no século XX, possívelmente seria mais acanhada e desprovida do ideário de grandeza já notório na monumentalidade arquitetônica da escola militar de Agulhas Negras; para melhor dissecar-lhe as origens, indispensável se torna a leitura de obra recentemente reeditada pela BibliEx, Marechal José Pessôa, a Força de Um Ideal, clássico militar de historiador renomado, o Coronel Hiram de Freitas Câmara.
A Academia, em sua gênese, expressa afinidade inquebrantável com a destinação análoga de suas antecessoras, desde a fundadora Real Academia de Artilharia, Fortificações e Desenho, sediada na Casa do Trem de Artilharia, no final do século XVIII, até a de anterior proximidade, a Escola Militar do Realengo; a esta, deve as turmas iniciais de cadetes, tradições, costumes e, acima de tudo, a própria razão de existir, nas formulações e ações desbravadoras do comandante da Escola, entre 1931 e 1934, o então coronel José Pessôa. De fato, numa sucessão de inovações de pronto consolidadas, típicas do caráter empreendedor de personalidade ímpar, o brilhante oficial de Cavalaria delineou a futura Academia na Escola do Campo de Marte do subúrbio carioca.
Revalorizou o título de cadete, marginalizado por intensa pregação positivista dominante no alvorecer da era republicana, acusando-o de aristocrático. Deu vida ao Corpo de Cadetes; renovou os processos de admissão, recrutamento, matrícula e as grades curriculares; modernizou as instalações, incluindo a construção de novo estádio, cassinos e refeitórios compatíveis com a dignificação social dos futuros chefes castrense; recriou os uniformes; criou o brasão das armas e o símbolo-mór do cadete e da Honra Militar: o Espadim de Caxias. Estas e tantas outras iniciativas subsidiavam a meta de se forjar nova mentalidade na formação dos quadros dirigentes do Exército, afinada com a atmosfera reformadora da recém-nomeada Segu nda República. Assim como exercera papel relevante na introdução dos blindados na Força Terrestre, e décadas adiante exerceria no planejamento da construção de Brasília, o incansável coronel Pessôa seria o grande impulsionador do despontar da AMAN a partir do autêntico laboratório em que, sob seu comando, a Escola Militar do Realengo se transformara.
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Idealizado na essência, intramuros do Realengo, o Cadete de Caxias viria corporificar-se na plenitude em Resende. Nas conexões afetivas de outra realidade sócio-escolar e nas razões objetivas do coração, diante de ambiência física sedutora e deslumbrante. Sobreviveriam os laranjeiras, atrelados à Academia como a fragrância onipresente das laranjeiras fincadas no solo de Realengo; de igual sorte os percevejos, pregados nas camas dos alojamentos até nas férias e dias de folga, elos de transição singela com a antiga Escola, sob novo cenário. Recorrendo a Pascal, há momentos em que as razões do coração irremediavelmente se submetem aos ditames da razão em si mesma.
Estreitar o conhecimento da AMAN, suas raízes, antecedentes históricos e atualidade, colabora para reforçar os pilares da razão perante a fortaleza inexpugnável da nossa profunda afeição. Contribui para melhor compreender o dinamismo extraordinário de um Soldado na superior acepção da palavra, o Marechal José Pessôa Cavalcanti de Albuquerque, que legou aos cadetes das gerações vindouras o ensinamento maior da força de um ideal, ao qual devem especial devoção e que, quarenta anos depois ainda emociona e faz cada eterno cadete da Turma Marechal Mascarenhas de Moraes bradar, a plenos pulmões: Quarenta Anos, Presente!!!

Rio, 26 de maio de 2012.

Cadete 1039, Nilo, de Cavalaria e Aspirante da Turma de 1972.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

PRETO, RACISTA, MACHISTA, COTISTA ...e chato.com

Longe vão os meus tempos de internauta bissexto. Depois que aderi à rotina de acesso à web descobri o quanto a vida pode oferecer de belas surpresas, inimagináveis a cerébros desprovidos de intelecto superior, como o deste rabugento provecto. Da cega indiferença ao entusiasmo incontido ignorei etapas, logo tornando-me usuário vibrante da rede e cultor de suas infinitas possibilidades de achegar-se da sabedoria plena, via democratização do conhecimento.
A paixão estonteante, sublime fase inaugural do amor, envolveu descobertas maravilhosas. Seduziam-me os títulos das mensagens recebidas, premonitórios de revelações aptas a produzirem enorme frisson na psique do neófito atarantado. Encantado com as promissoras verdades dignas de absorção, corria a abrir vastíssima sucessão de e-mail, prenhe de curiosidade. Mesmo assim, malgrado prisioneiro de atração mórbida, escorava-me nos valores puritanos de vetusta formação cavalariano-cruzmaltina e, de antemão, deletava apenas indicações de baixo erotismo e de vulgaridades cruentas sobre o Gigante da Colina. Temas outros eram bem-vindos e propiciariam inegável ajuda ao meu engrandecimenrto pess oal, tal qual mostrarei no prosseguimento.
Como é Feito o Papel Higiênico que Importamos da China; O Casamento Minnie-Pateta; Namoro com o Mecânico; Café da Manhã; Um Homem Deve Usar Brinco?; Papel Alumínio: Dez Maneiras de Usar; Conexão da Inverdade; Nova Tabela: Será Verdade?; Nota de Esclarecimento Programa de TV; Rico Também Anda de Ônibus; Porque Prefiro os Cachorros aos Gatos; A Rainha dos Baixinhos ... na Putaria; Pense em um Sacana; A Mordida do Mineirinho; Pensamento Sexual do Dia; Laudo de Conjunção Carnal em SP e Orgasmograma...Colossal!!!, perfazem amostra de mensagens recentemente postadas em minha caixa postal. Evidentemente que as seis derradeiras listadas, coerente com os princípios antes mencionados tiveram de imediato o rumo da lixeira; aqui só as extern o sob o propósito singular de evidenciar a extensa pluralidade da temática abordada. E nada mais, juro.
A cada título exposto, correspondia peculiar reação deste ingênuo primata. Como é Feito o Papel Higiênico..., por exemplo, ainda está a inspirar-me séria análise geopolítica sobre o teor das relações bilaterais sino-brasileiras. Jamais suspeitei estivesse em nível tão estreito, e que a cultura daquele país asiático pudesse adentrar com tamanha facilidade e voluntarismo a intimidade de milhões de conterrâneos; Um Homem Deve Usar Brincos? e Papel Alumínio: Dez Maneiras de Usar, deflagraram-me graves questionamentos existenciais, enquanto Nova Tabela: Será Verdade? causou mergulho abissal no domínio das pulsões primárias, o Id freudiano de instintos e sonhos irrealizados perante o Superego controlador. São meras ilustrações pinçadas de amplo universo, porém representativas de quanto a familiaridade com a rede viria a influenciar este ser decrépito, adequando-o aos tempos modernos.
Além do caráter pedagógico nelas veiculado, as principais matérias enviadas coincidem num aspecto: a reiteração abusiva, parecendo haver perverso conluio dos remetentes para ensandecer este destinatário. As de conotação sexual são repetidas ad nauseam e dispenso-me comentá-las; numa única jornada, recebi nove Notas de Esclarecimento de Programa de TV, sete de Rico Também Anda de Ônibus e seis de Porque Prefiro os Cachorros aos Gatos, isso sem computar demais remessas esparsas em diferentes datas. Durma-se com um bombardeio desses, autêntica eficácia de exocets virtuais. Até aí entretanto imperava relativa calmaria, se comparado ao que estava a acontecer.
Quase a submergir na enxurrada de mensagens, levo jab, sou nocauteado e, cambaleante, reerguido para divisar o seguinte título: “ Nem Negro, nem Índio, nem Viado, nem Assaltante, nem Guerrilheiro, nem Invasor. Como Faço?. Pauleira hard, pura Klu Klux Klan cabocla século XXI, ainda atordoado, visão turva com o gentilíssimo chamamento da matéria, tento identificar o remetente: trata-se de estimado confrade da Arma Ligeira. Menos mal, penso, atenuante primária. Abro o e-mail e nova surpresa ao me deparar com o título original: Sou Branco, Honesto, Contribuinte, Eleitor, Hetero...Para Quê?, da lavra de renomado tributarista. Constatação óbvia: o meu fraterno perissodáctilo, no adotar o artifício da negação enfatizante, de moto próprio elevou o tom da indignação do tal jurista ariano aos píncaros da delicadeza absoluta. Qualé, Dom AT, linha do tempo Alabama-Nikiti ?
Evitarei adentrar o mérito das considerações de Sou branco... ou Nem negro..., pois suscitariam réplica demasiado longa; o que move meus comentários são observações amparadas a partir da avalanche de mensagens iguais que se seguiram à do notável arianófilo das baias. Até hoje, mais de dezena, a confundir as pobres percepções antroposociológicas deste asno sobre a verdadeira identidade racial da população brasileira, levando-me às conclusões subsequentes:
1. A maioria da população tupiniquim é de ascendência nórdica, similar ou assim se reconhece. Reafirmo, desse modo, minha condição sempiterna e próxima à extinção de pelagem sete, portanto integrante de minoria excluída;
2. Não sendo branco, índio, amarelo, moreninho ou negro de alma branca, e sofrendo invectivas virtuais do tipo de Nem negro..., acabo de fundar grupo quilombola combatente para defender-me de tais ataques e lutar pela sobrevivência da negritude em nossas plagas, diante do que, contrariado, sou compulsado a vestir a pele de racista oprimido;
3. Criado à beira do Turano nos anos 60, sem as chiques UPP atuais, depois engajado nos ritos da nobre Cavalaria, julgo dispensável reafirmar minha natureza congênita de machista irretratável;
4. Sendo preto, racista e machista, assim triplamente excluído nos idos correntes, julgo merecer o beneplácito da inclusão no rol das cotas, seja lá para o que e onde elas forem aplicáveis;
5. Alerto o esmagador contingente de arianos, nórdicos e escandinavos integrantes da turba pátria já dispor este exótico espécime racial de armamento dissuasor, em face transgressores da minha cota de tolerância internáutica. Trata-se do vil poema Neguinho, doce antídoto contra os e-mail de conteúdos acacianos, repetitivos ou redundantes; revelo que dois correspondentes diletos já foram agraciados com os versos torpes do opúsculo, no qual pretendi ser tão ou mais chato do que eles tem sido comigo.
Agradeço ao gentil repassador de Sou branco..., reintitulado Nem negro..., pois sem a sua providencial mensagem estaria ainda a incorrer na indesculpável suposição de ser a composição racial da nacionalidade majoritariamente negra, mulata, ou parda. Agora, ciente de que somos um país de ascendência com predominância ariana, assumo ser crescentemente minoria.
Alfim, reitero o significado de Neguinho, o poema. Aos contemplados com o recebimento dos versos nefandos, saibam estou a exprimir reação iracunda diante do conteúdo de mensagens deles exaradas a minha humilde caixa postal; se a curiosidade não os impedir, poderão a um simples clique do mouse deletá-lo já na leitura do título, assim como a este Preto, Racista, Machista, Cotista ...e chato.com.
Dom Obá III, internauta étnico desiludido, em franca desaceleração da web.
Rio, 19 de maio de 2012

O CORONEL, O SOLDADO E A FERRAMENTA.


               Era o ano de 1985 e eu, capitão aperfeiçoado, comandava a Companhia de Comando da Brigada de Infantaria Pára-quedista. Aproximava-se o início da Operação SACI e a Brigada vivia uma agitação fenomenal. Afinal, essa operação era o exercício de campo que coroava o ano de instrução da Brigada e todas as atenções estavam direcionadas para a FT SANTOS DUMONT. Os meios disponíveis da FAB eram canalizados em apoio ao desenvolvimento do componente aéreo da operação. Os Estados-Maiores da Brigada e da FAT faziam seus acertos para que o assalto aeroterrestre pudesse contar com o maior número de aeronaves, o que acrescentaria ao exercício a qualidade desejada em termos de planejamento e execução. Os integrantes da 3ª Seção e Seção de Planejamento da Brigada realizavam os cálculos das necessidades em combustível, Classe I e pára-quedas, entre outros itens de suprimento de relevância para a operação.

               A minha subunidade tinha, também, um papel importante nessa operação. Além de apoiar o Comando da Brigada no desdobramento do Posto de Comando na área de operações, seus integrantes mobiliavam as diversas seções de Estado-Maior e, também, as denominadas de repartições administrativas. Fui convocado pelo chefe da 3ª Seção e lá compareci. Adentrei a imensa sala situada no QG, cumprimentei os oficiais e praças, notando a grande agitação reinante. Apresentei-me ao Chefe e, após as saudações, sentei-me.

            O Chefe da 3ª Seção da Brigada era o coronel de Artilharia WENCESLAU MALTA. Suas qualidades profissionais eram sobejamente testadas pela diversidade de missões que lhe eram afetas e pela própria dinâmica que a atividade de salto acrescenta a qualquer modalidade de instrução militar. Por diversas vezes pude observar a forma peculiar com que o Chefe da 3ª Seção controlava as situações adversas, empregando a sua experiência profissional e o bom humor, fatores que contagiavam aqueles que se encontravam trabalhando sob suas ordens. Em determinada ocasião, uma subunidade de um Batalhão que acabara de realizar um exercício em Boa Vista (RR) necessitava de resgate aéreo com urgência. Entretanto, as aeronaves inicialmente direcionadas para aquele apoio tinham sido deslocadas para atender uma calamidade em parte do território nacional. Ao mesmo tempo, o Centro de Instrução solicitava prioridade para resgatar os alunos do Curso de Forças Especiais que haviam terminado uma semana de intensos exercícios em Porto Murtinho (MS) e deveriam se deslocar para o CIGS, em Manaus (AM). Como conseguir aeronaves para atender as necessidades apresentadas naquele momento, no desenrolar de tantas outras missões em andamento? No calor de toda aquela situação delicada o coronel reagia da seguinte forma: abria um sorriso que deixava dúvidas se era de pavor ou zombaria com o problema apresentado e, ato contínuo, disparava uma série de impropérios. Após essa natural descontração, começava a distribuir ordens que contribuíam para solucionar aquela momentânea dificuldade. Normalmente, conseguia o seu intento com sucesso e a paz voltava a sua seção. Por pouco tempo.

              O coronel Malta foi campeão olímpico de pentatlo moderno, um dos mais destacados atletas do Exército e orgulho da Turma de 1954 da AMAN. Como ser humano, era uma pessoa dotada de excelente humor, educado, prestativo e sabia valorizar a vida com intensidade. A prática de esportes contribuiu para que ostentasse uma capacidade física invejável. Exímio jogador de dupla de voleibol confiava na sua habilidade no trato com a bola e o domínio da quadra. Dessa forma, mantinha uma caderneta destinada a controlar os militares e civis que lhe deviam rodadas de choppes, em razão de partidas perdidas em calorosos embates nas quadras de areia, cimento e praia. Ter o nome naquela caderneta era motivo de gozação.

             Como já narrado, encontrava-me sentado em frente a sua mesa de trabalho para acertar os detalhes do apoio que a companhia deveria prestar ao Comando da Brigada na Operação SACI. Inicialmente, negociávamos a composição da minha equipe na operação, em face das restrições de aeronaves. De repente, toca o telefone e o coronel identifica do outro lado da linha um major da AD/1, velho freguês de dupla de voleibol e perdedor sempre ávido a solicitar uma revanche, em razão de sua dívida em choppes alcançar números preocupantes para um jogador com reputação naquela atividade. O major estava desafiando o coronel para uma partida na quadra do QG da Brigada, às 16h30min daquela tarde. Rapidamente, como uma águia a espreita, o coronel quis saber quem era o parceiro do seu desafiador, pois esse dado era fundamental para que ele pudesse avaliar os riscos e escolher quem seria o seu companheiro na partida. O major respondeu que era um tenente de Artilharia. Completou, acrescentando o nome, a unidade e a Turma da AMAN do jovem tenente. O coronel anotou os dados e, prontamente, aceitou o desafio. Antes, porém, lembrou ao major que a partida seria realizada de acordo com a cláusula mais importante do regimento interno que controlava aquele tipo de embate: o perdedor pagaria dois choppes ao vencedor.

              Enquanto acertávamos detalhes da operação, ele emanava uma série de ordens. Solicitou que fosse realizada uma ligação telefônica com o comandante do 8º GAC Pqdt, em razão do tenente ser de Artilharia e, como explanado, ele precisava de informações sobre o oficial subalterno que jogaria ao lado do major. Comandava a unidade o Coronel de Artilharia Ary Schittini Mesquita. Ele recebeu do coronel Malta a solicitação de localizar um tenente que pertencesse a Turma de AMAN do parceiro do major. Pouco depois, ligou um tenente do GACPqdt e passou informações vitais para o coronel. Revelou que o seu companheiro de Turma era um excelente jogador de voleibol, com passagens pela seleção da Academia, Festival Sul-Americano de Cadetes e das Forças Armadas. Um verdadeiro atleta, consagrado campeão da modalidade e hábil no jogo de dupla. Percebi que, a partir dessas informações, o Chefe da 3ª Seção demonstrava preocupação com o adversário. Ele, então, revelou que precisava alterar a estratégia para derrotar o velho freguês.

               Um dos seus parceiros mais habitual era o então capitão Fernando Azevedo e Silva, da Turma de 1976 e atual oficial general, com passagens pelas diversas seleções da Força e excelente jogador de dupla. Mas, para aquele embate, era preciso equilibrar as equipes no quesito juventude. Para tanto, realizou um contato telefônico com o comandante do 20º BlogPqdt, Coronel Eng Manoel Cândido de Andrade, ao qual solicitou que o soldado Marcos fosse liberado para estar na quadra de voleibol do QG da Brigada, naquela tarde, às 16h30min. Recomendou, com muita ênfase, que o soldado não se esquecesse de conduzir a ferramenta.

                     Não pude me conter e questionei que ferramenta era aquela e porque a escolha do soldado Marcos. O coronel disse-me que o soldado era levantador do time de Voleibol do Botafogo, que a época possuía o melhor esquadrão do Rio de Janeiro, o que equilibraria a contenda quanto o aspecto juventude. Quanto à ferramenta, manteve a surpresa. Ele convidou-me a assistir a partida e verificar, com os próprios olhos, a necessidade e a importância daquele instrumento específico de trabalho para o embate.

                    Passei o restante da manhã pensando qual seria a importância da misteriosa ferramenta e torcendo que chegasse logo à hora da partida. Após realizar a formatura rotineira de término de expediente e dispensar a subunidade, iniciei o deslocamento para o Quartel-General da Brigada, local onde seria realizada a partida. Ao Chegar, encontrei o major e seu parceiro. O oficial superior vestia um calção preto e demonstrava possuir intimidade com a atividade que iria desenvolver. O seu parceiro, jovem oficial subalterno, não poupava esforços para evitar que a bola tocasse o chão, naqueles momentos de aquecimento que antecedia a peleja. A impressão que se tinha era de que o entrosamento da dupla chegava próximo da perfeição. Tudo pronto. Faltavam o coronel Malta e o seu companheiro de equipe.

                      Não foi difícil identificar o soldado Marcos. Àquela hora, somente estavam no QG o pessoal de serviço e alguns integrantes da 3ª Seção. Dessa forma, qualquer outro militar que estivesse na área da quadra chamava a atenção. Visualizei, a uns vinte metros, um soldado com uma tesoura de cortar grama. O dito cortador de grama, aliás, enganador, devia ser o soldado Marcos. Fingia que estava realizando uma tarefa árdua e cumpria seu papel no espetáculo preparado pelo coronel.
                     Chega o coronel Malta. Aos berros, reclama do atraso do capitão Fernando e solicita que o Comandante da Guarda do QG realize ligações telefônicas para o Destacamento Precursor Pqdt e baiúca dos Afonsos, na busca do paradeiro do citado oficial. Ora, o capitão Fernando estava realizando uma atividade longe do Rio de Janeiro e nem sabia da partida. Tudo era uma encenação da velha e ladina raposa. Claro que o capitão não foi localizado e, no momento, crescia a possibilidade de a partida não se realizar.

                      Ao perceber a situação, o major começa a lamentar que a partida não fosse acontecer e que, pensando com seus botões, ele não poderia perder a chance de derrotar o coronel, abatendo de sua extensa dívida dois choppes. Foi uma atividade estudada com muita cautela. Idealizada e programada para vencer, principalmente, em face da escolha de seu parceiro. Tinham realizados vários treinamentos e o momento era aquele. Talvez não houvesse outra oportunidade como a que se apresentava.

                      O coronel, então, é pressionado pelo major. Demonstrando ansiedade, o desafiante afirma que a partida precisa ser realizada. A ausência do capitão Fernando não pode ser motivo para suspender a peleja.  O coronel argumenta que não iria correr de um desafio, pois tinha uma estória de conquistas a defender. Era só encontrar um parceiro. Qualquer um! Exclama o coronel.

                       Momentos de tensão.

                       O coronel procura, olha para todos os cantos e, num lance estudado, localiza o solitário soldado. Concentra o olhar na direção do soldado, que continuava fingindo estar utilizando a tesoura, e pergunta: “Mocorongo! Ei! Mocorongo! você sabe jogar voleibol? Com hesitação, o soldado responde que sim, sem demonstrar muita firmeza, como se a sua participação fosse apenas para permitir a realização da partida. Virando-se para o major, o coronel, com a expressão facial de lamento, questiona: “Aceita ele como meu parceiro?

                      O major ou qualquer cristão que estivesse assistindo a cena jamais iria pensar ou acreditar que um soldado, com uma tesoura de cortar grama, pudesse incomodar uma dupla treinada e pronta para derrotar qualquer adversário. Também, deve ter pensado, que sorte a deles que aquele militar estava ali naquele momento. O coronel não poderia convocar um soldado da guarda do QG. Impossível essa hipótese. O major deve ter raciocinado: “um soldado e, ainda, portando uma tesoura de cortar grama. Chamado de mocorongo. Isso é sopa demais”. Aceitou.

                      O coronel, então, convoca o soldado para a partida e alerta, em tom baixo: “Marcos! garoto! mesmo esquema de sempre, perdemos a primeira e ganhamos as outras duas”. Virou-se para mim e falou: “percebeu, capitão, que ninguém acredita que um soldado, manuseando uma tesoura de cortar grama e sendo chamado de mocorongo, possa ser um excelente jogador de dupla de voleibol. Esse é o mistério da ferramenta. A sua presença no local da contenda confunde o adversário”. Concluiu, com o sorriso maroto.

                       Foi o que aconteceu. Derrota do major e do tenente. Ao término da partida, pude ver o coronel anotando mais dois choppes na conta do major, em sua inseparável caderneta. O coronel Malta, que era um cavalheiro, convidou para que todos fossem ao “MARLENE”, tradicional restaurante localizado em frente ao Portão da Base Aérea dos Afonsos, a fim de consumirem rodadas de choppes. É claro que seriam pagas pelo major, naturalmente.

                      Relembrando esse episódio, presto minha homenagem ao chefe e amigo, no momento em que tomo o conhecimento de seu passamento, em dezembro de 2010. De luto o Exército Brasileiro, a Artilharia Pára-quedista, seus amigos, admiradores e jogadores de dupla de voleibol. 

Cadete Simões Junior – Curso de Infantaria - AMAN 1972.

IDIOTAS E BOSTEJADORES

 Ao interagir na rede expondo ideias próprias, venho sofrendo críticas acerbas de amigos e companheiros diletos. Algumas, sob a mais perversa modalidade de desaprovação, a indiferença intencional e sistemática; outras, sob tons irônicos de descrédito e menos valia explícita. Hoje, inflado nas asas da audácia insensata e inspirado em episódio recente, resolvi dar o troco apregoando este arremedo de tese.

Melhor combater à sombra, há milênios já ponderava o sábio general Leônidas, o das Termópilas. Optei, portanto, por suave desafiar de oponentes reconhecidos, no TO deste leve torpedeamento retórico: dois estimados analistas contudentes do meu estilo subliterário, pois a eles ao menos devo a gratidão de me externarem juízos, mesmo depreciativos. Preliminarmente, julgo de bom alvitre esclarecer a natureza de suas personalidades e da peculiar relação que desde eras imemoriais nos aproxima.

Detentores de perfis comportamentais semelhantes, destacam-se pela inteligência soberba, caráter ilibado, coragem em suas acepções viscerais, lealdade e devoção aos amigos. Profissionais exponenciais, empreendedores e bem-sucedidos nos propósitos pessoais, exercem natural influência na ambiência de suas atuações, onde são justamente prestigiados. Desfrutar-lhes da amizade excede em privilégio. Cartesianos de carteirinha, condição em si apenas não-demeritória, absorveram tamanho viés de crua objetividade nas percepções sobre o planeta, a vida e os indivíduos que ora carecem de revisão de fundamentos, em inescapável back to basic atitudinal. Escravos da funcionalidade avassaladora e triunfante, estão quase a se desumaniza r, rumo ao patamar de autênticos andróides caricaturais.

Domingo, 13 de maio corrente, o outrora aristocrático Fluminense sagra-se campeão carioca deste ano. No dia da redenção da escravatura, ó coincidência astral, o clube das Laranjeiras, nas origens ditas fidalgas avesso à participação de negros, mulatos e descamisados em suas equipes de representação, reconquista insigne laurel esportivo. Ao associar a data e a vitória, assoma a extraordinária figura de torcedor antediluviano: Nelson Rodrigues, o afamado escritor, dramaturgo e jornalista, que se vivo estivesse completaria centenário de vida em 2012. A promulgação da Lei Áurea, o Fluminense, o tricolor Nelson e meus detratores, aonde chegaremos nesta senda de trajeto surreal?

Nelson personificava superposição rara de manifestações genéticas, pois ao desmoralizar a segregação natural entre persona literária e individualidade, preservava-se ser uno e indivisível em tempo integral. Frasista emérito, foi arguto apreciador da natureza humana, provocando frisson quando dela desmascarava as entranhas da hipocrisia, sobretudo lá pelos anos 1950 e 1960, em crônicas publicadas nos jornais da época. A série A Vida Como Ela É, de duradoura periodicidade diária, inspirou-lhe a concessão do apelido de Anjo Pornográfico, uma de suas celebrizações notórias. Ao futebol, paixão de toda uma vida, dignou-se oferecer status de refinamento literário até então impensável; conjectura-se que, depois dele, ninguem mais deveria ousar escrever sobre o antigo esporte bretão. Da infinidade de frases, expressões e pensamentos derivados da sua pena genial, extraio personagem de atualidade instigante: O Idiota da Objetividade (IO).

Há idiotas e idiotas. O idiota fundamental, categoria da qual sou sócio remido, é de facílima identificação. Somos beócios em inarredável estado de passividade existencial, contemplativos diante do mundo e da mundanidade. Assim nascemos, assim permanecemos, assim inapelavelmente seremos. Nelson asseverou que “o grande acontecimento do século (XX) foi a ascensão espantosa e fulminante do idiota”; referia-se, sem dúvida, ao idiota absoluto, ao idiota fundamental que tão bem represento. Embora também o tenha consagrado, subestimou a dimensão fantástica que o idiota da objetividade alcançaria no século seguinte.

Os amigos diletos antes citados, os quais alvejo nestas palavras, considero-os estimados idiotas da objetividade. De novo enfatizo as excelsas virtudes enunciadas, malgrado não os absolverem da pecha rodrigueana, de preocupante aplicabilidade nestes tempos de supremacia distorcida da pura lógica cartesiana.

Um, menos tolerante, há muito pespegou-me o rótulo de O Bostejador. Na verdade, eminente causídico e possuidor de notório saber jurídico, transita entre a rigorosa via da conduta castrense nativa e os maneirismos sutis da via forense adotiva. Eu, bostejador, iletrado cabo das baias diante do advogado convincente e ilustre? Fala sério, mermão...

O outro, tricolor tresloucado, vive a citar Nelson, numa reverberação suspeita que o denuncia como cultor de uma frase só: aquela do “então vos digo, etc e tal; e podem me dizer que os fatos provam o contrário, que eu vos respondo: pior para os fatos”. Ora, ora, ora, mestre do conhecimento wilkipédico, oriente-se antes de adentrar o brejo montando a vaca sagrada. Amigo especial e querido, tal qual o doutor das leis, chega a causar-me perplexidade sua piração autofágica. Dia desses, ao criticar texto de minha lavra, expeliu esta pérola: “... comparar a infância de um dos Beatles com as reuniões inconsequentes de uma cambada de coroas??? Só vc mesmo. Apesar do comentário, excelente texto. Está se superando. Nesse texto con seguiu até alguma objetividade...”. Quer dizer que os verdes anos iluminados de John Lennon, na visão colonizada do crítico, foram comparados à obscuridade decadente de velhinhos amontoados no CMPV? Fala sério, mermão campeão. Você retratou a mais perfeita tradução do IO, na lídima versão fundadora: a de alguém que não enxerga um palmo além do óbvio ululante de babar na gravata.

Parodiando o profeta Nelson, então eu vos digo, caros amigos IO: administrem-se doses cavalares da melhor poesia. Temperem a busca frenética da objetividade com o lirismo de certos bostejos inconsequentes, pois “o adulto não existe. O homem é um menino perene”, ainda segundo o imortal escritor tricolor. Recorrendo a outros mestres, Tom e Newton Mendonça, no peito dos bostejadores também bate um coração. Tanto bate que este humilde cabo das baias, a findar, lhes agradece a compreensão de seus desvarios, reitera insuperável estima e oferece aplicação inicial da medicação sugerida, nos versos seguintes:

Dupla existência da verdade
Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado um com o outro. Cada um me contou a narrativa de por que se haviam zangado. Cada um me disse a verdade. Cada um me contou as suas razões. Ambos tinham razão. Ambos tinham toda a razão. Não era que um via uma coisa e outro outra, ou que um via um lado das coisas e outro lado diferente. Não: cada um via as coisas exatamente como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao outro, mas cada um via uma coisa diferente, e cada um, portanto, tinha razão. Fiquei confuso desta dupla existência da verdade.
Fernando Pessoa, Encontro de Poesia.
Dom Obá III, idiota fundamental, bostejador reles e apreciador da amizade incondicional. Da Quinta histórica de São Januário, já concentrado para a noite de amanhã.
Rio, 15 de maio de 2012. Nilo

EXOCETS AO INTERNAUTA QUALQUER

Assustam-me irrefreáveis temores, em permanente taquicardia
Derivada de aviso postado na web pelo Pimpim há alguns dias
Alertando sobre hacker infame, talvez homem...ou bela mulher
Pirata hodierno a invadir de 72 os e-mail...o internauta qualquer

Apto a falsear as mais puras, renitentes e consagradas verdades
E alterar dados, retocar fatos, demolir causos, pétreas realidades
Sem desconfiança gerar, ao expedir factóides muito convincentes
Que atemorizam bem depois, ao repenicarem as mentiras na gente

Do mundo, agora a suspeitar, adotei os ensinamentos de São Tomé
Para somente crer naquilo visível, sobretudo após libelo do Zé Boré
Pertinente e oportuno, fez cessar certos rumores, boataria sem nexo
Disseminada na rede para tumultuar a celebração do Dia do Exército

Considero, entretanto, alguma reação imediata há de se especular
Fito desmascarar o farsante, em sutil vingança soberba a imaginar
De tal modo a contrariar suas vis, repulsivas e desvairadas malícias
Só inserindo cacos, insinuando inverdades, na exaltação de notícias

Recrutado e ciente da missão, vou explorar elementos de fantasia
Em sinergia com a rusticidade e vetores 3C da operosa Cavalaria
Otimista, intento bem cedo infernizar o HD do criminoso internauta
A confundir-lhe as ideias, embaralhar-lhe a rotina e melar sua pauta

Opino ser a reunião de maio no asseado e charmoso bar Marronzinho
Legando à Praia Vermelha sua feia visão, o CMPV e o seu mezanino
Inovando o lay-out das chamadas, a conclamar a tchurma da Flu-gay
Onde confrade militou de bombachas, embora negue, ele ali já foi rei

A genealogia pode ser matéria bacana, quando recordo a matriz ariana
De um amigo originário de Freiburg, a inspirar-me ter pé em Hamburgo
Ou anunciar que nasci em Bagé, cresci em Bagdá e habito Copacabana
E denunciar o Baciuk, caucasiano falso, de berço nas africanas savanas

Aposentar o Ayrton e o Peres de saltar, liderar ativas águias de prata
Seria esmurrar com maldade inaudita a frágil memória do insano pirata
Pois nossos ousados guerreiros alados, no éter agentes de viril poesia
Dela, mão jamais abririam, no limitar o saboreio de incríveis fantasias

Grão-vizir Pimpa, Volota e Coquinho reverenciam o pavilhão cruzmaltino
Sob a imortal paixão de ilustres vascaínos, desde os idos de meninos
Censurando Mota, Piranha, Lobo, KbçA e eu pelo indescritível desatino
De urubulinos fiéis, loas ensandecidas entoando ao Galinho de Quintino

Mermão I. Salvanyus retornou, no antigo burgo, ao bairro de Marechal
Perto imperou na área de Realengo, antes de chamar-lhe Portal Infernal
Vibra a galera com as ausências nunca sentidas do infante maduro Feijão
Junto ao Meireles, o Bezerra, o Valtinho, o Pulinho e o Marques Frazão

Mestre Patinho, lente sério, às do IME a destilar leis da Física Quântica
Aos alunos Bastos, Dal Bello, Félix e Cardosinho, no rigor da semântica
Nada surpreende, malgrado o filólogo Bac subestimar o Centro Hípico
Ou o Dr Boita adentrar os tribunais a sussurrar o seu brado mais típico

Mário Augusto, ex-morador da Pituba, convicto, renegar a Bahia eterna
Ou Dom Citiziu Prec, do espaço temente, desfazer-se do seu paraquedas
Calma, gente, são apenas exocets deletérios alardeados na web guerrilha
Para a Nação 72 destruir o internauta qualquer, e sua infamante quadrilha!!!

Rio de Janeiro, 01 de maio de 2012. Nilo

HINO DA IRMANDADE 72!

Caríssimo e Prezado Pimpa

Nesta data de profundo significado histórico, a provocar-me recolhimento e meditação no meu aconchegante cafofo atijolado do Alto Babilônia, fui de súbito tomado por irrefreável estado de inspiração artística. Sem identificar-lhe até este momento o motivo, permito-me suspeitar de eflúvios advindos da Mama África, seus atabaques e tambores para mim ancestrais.
Do misterioso transe autoral surgiu a composição a que nomeei Hino da Irmandade 72; trata-se, na verdade, de apropriação assumida de música tema dos aviadores brasileiros (A Esquadrilha), a que adaptei letra homenageando a gloriosa Tu MMM.
Sugiro exaustivos ensaios pessoais dos confrades da Seção Rio de Janeiro da Turma para que na próxima reunião, em junho, possamos entoá-lo de público, em uníssono. Sugiro, outrossim, que doravante os atos de abertura e de encerramento da assembleias no CMPV sejam abrilhantados com o canto da composição em apreço.
Friso que estou a submeter o assunto a apreciação desse estimado condutor dos destinos da Turma, para deliberação e aprovação do Hino e das circunstâncias a ele relacionadas.

Saudações reverenciais. Dom Obá III, hoje em especial usufruto de sua cota anual de reflexão existencial.

HINO DA IRMANDADE 72
A Irmandade é um punhado de amigos
A vibrar, a vibrar de emoção
Não tememos das ruas o perigo
Nem do trânsito infernal confusão
A cada mês esquecemos o siso
Bandeirantes audazes do riso
Ao Baluarte acorremos aflitos
Pra conversar e rever os amigos
Contato, companheiros
Ao Círculo, sobranceiros
Lancemos o bradar
Da Turma, a zoar.
Bis
Não importa distância e espaço
E mil propostas pra escapulir
Combatentes do ferro e balaço
Não nos faz o porvir desistir
Suplicamos as benesses da sorte
Pra que a vida permita alongar
Ao infinito essa chama sem corte
Da amizade da Turma sem par
Contato, companheiros
Ao Círculo, sobranceiros
Lancemos o bradar
Da Turma, a zoar.
Bis.
Rio, 13 de maio de 2012. Nilo

O CADETE e o cheque!


Eram tempos de espera e ansiedade. Aproximava-se o Dia da Festa da Espada e os integrantes da garbosa Turma Marechal Mascarenhas de Morais não cabiam em si de orgulho e sentimento de dever cumprido. As rotineiras e cansativas entradas no PTM para afiar os cadetes no treinamento para a festa, o portar a espada de oficial do Exército Brasileiro, o experimentar diário dos novos uniformes que envergaríamos como aspirantes, a organizada passeata após o jantar, com os fuscas zero bala pelas ruas de Resende, as notícias sobre a viagem dos pais, namoradas e madrinhas em direção a AMAN e, para não fugir a regra, o famoso coral alertando a bicharada, calourada e afins que faltavam quatro dias para o aspirantado, tudo fazia parte desses momentos inesquecíveis, nossos últimos dias como cadete.
Além das preocupações normais com a nova etapa na vida profissional, eu tinha uma importante atividade dias após receber a estrela de aspirante: meu casamento com a Clara. Após quatro anos de namoro e noivado, avaliei que era interessante aproveitar a presença de minha mãe (meu pai falecera), irmãos e parentes em Resende para me casar. Estava classificado em Goiânia (GO) e pretendia, após os dois anos de serviço na unidade, tentar uma transferência para o Batalhão de Polícia do Exército de Brasília. Dessa forma, o princípio da oportunidade tinha que ser aproveitado.
Avaliei que precisaria dispor de uma quantia a mais do que fui provido em recursos financeiros pela conclusão do curso, para somar aquilo que receberia de presentes de casamento. Resolvi solicitar um empréstimo de Cr$ 9.000,00 (nove mil cruzeiros) na CAPEMI. A entidade tinha realizado uma palestra na AMAN sobre a necessidade de o militar possuir um seguro de vida e oferecia a oportunidade do futuro aspirante dispor dessa citada quantia como empréstimo consignável.
Acredito que o fato tenha acontecido na quinta-feira antes do dia da Entrega da Espada. O recebimento dos cheques do empréstimo da CAPEMI se fazia por ordem alfabética nas dependências da SAM, ali ao lado do CC. Esperei com muita calma, já que meu nome é Valter. No momento da entrega do cheque, lembro-me que, entre outros estava na fila o Walber Guerreiro, do Curso de Infantaria. Aproximei-me e o representante da CAPEMI, trajando um terno preto, entregou-me um cheque no valor de oito mil e novecentos e vinte e poucos cruzeiros.
Recusei-me a assinar o recebimento do dito cheque, argumentado que o valor correto era nove mil cruzeiros. O cidadão disse: aspirante, existem descontos de taxa de seguro, risco saúde, queda da bolsa de New York, vitória do Flamengo, eleição do “cacareco” e outras pendências normais do mundo financeiro. Esse procedimento está correto e é praticado com todos os que solicitam empréstimo. Não se preocupe, está tudo correto.
Havia, na sala da SAM, um cartaz da CAPEMI fazendo referência à possibilidade do empréstimo, bem elaborado e ostentava, em destaque, o valor de nove mil cruzeiros. Acho que era o limite que nós, os aspirantes, podíamos receber, dentro de uma margem consignável. Apontei para a propaganda da CAPEMI e disse: entendo que o valor que eu solicitei é o que se encontra ressaltado neste cartaz da sua empresa. Ali, não explica nada sobre descontos.
Encontrava-se presente no local, outro cidadão de terno, aparentando ter uns sessenta e poucos anos de idade. Virou-se o meu interlocutor e disse: general, o cadete recusa-se a receber o cheque. Pronto. Levei uma enquadrada. Antes era aspirante, agora voltei a ser cadete e estava criando problema ao desenrolar da atividade.  A idéia de dispor dessa importância para o casamento sofria o primeiro abalo. Pensei em desistir, não do casamento. Entretanto, eu estava correto. Segui em frente.
O general, muito educado, tornou a me explicar as razões para que a CAPEMI realizasse aquele procedimento rotineiro de abater do montante solicitado os descontos obrigatórios. Eu, na posição de sentido, escutava e, como resposta, apontava o cartaz. Mantive a posição e estava decidido: recebia o que tinha solicitado ou não haveria empréstimo. Nesse momento, o Walber manifestou-se afirmando que estava solidário comigo e não receberia o cheque com descontos. Momento de tensão.
A experiência do general, chefe militar, valeu nessa hora. Ele disse: cadete, acho que não agimos com a transparência que se faz necessário em transações como esta. Vocês deviam ser informados de tudo, inclusive os descontos obrigatórios. Vou comunicar a direção da CAPEMI o fato e gostaria que você comparecesse na sede da instituição na segunda-feira, pois é o dia de reunião da diretoria e seu caso, fatalmente, será avaliado.  Despedimo-nos, com a promessa de novo encontro no dia aprazado.
Na segunda-feira, após a missa e o baile, compareci a sede da CAPEMI. Se não me engano, fica na rua Sete de Setembro, no centro do Rio de Janeiro. Lá, fui recebido pela secretária da direção da CAPEMI e, pouco tempo depois, o general surgiu na sala e entregou-me um cheque nominal no valor de Cr$ 9.000,00. Emocionado, ele disse: a direção da CAPEMI reconhece que precisa modificar o relacionamento com a AMAN, no tocante a empréstimos destinados aos aspirantes. Decidiu, ainda, devolver a todos os aspirantes, seus colegas, que foram penalizados com os descontos obrigatórios, a importância recolhida à maior. Pretende, também, alterar a palestra ministrada para os futuros aspirantes, de maneira a permitir um esclarecimento amplo e transparente a respeito da transação com empréstimos financeiros. Finalmente, concluiu: os cartazes serão recolhidos e passarão por aperfeiçoamentos.
Saí com um sorriso de vitória estampado na face. Venceu a ousadia do cadete. O valor descontado no empréstimo foi ressarcido pela CAPEMI para todos que o realizaram, conforme pude averiguar com os companheiros do 36º BIMtz. Não posso afirmar se, a época, um documento da CAPEMI informou a decisão de devolver os descontos. Provavelmente, não. O INFORMEX não circulava. Alguns nem perceberam a devolução. Aspirante da MMM não se preocupava com contracheque. Se o líquido estava próximo daquilo depositado no mês anterior, nada a reclamar.
Ao relembrar este “causo’, fiz questão de consultar a pasta com as minhas alterações. Nela está escrito e transcrevo: “CONSIGNAÇÃO – AVERBAÇÃO: Em 2 Jan, foi público ter sido mandado averbar nos seus vencimentos, em favos da CAPEMI, as importâncias de Cr$ 40,00 e Cr$ 381,00 a partir de fev 73, referente a pecúlio e empréstimo, respectivamente ( pecúlio: sem prazo e empréstimo por 24 meses).
Entendo, agora, que aquele general deveria se tornar o patrono do atual PROCON. Ele percebeu a cerca de trinta e sete anos atrás, que aquilo era uma propaganda enganosa. Era um homem a frente do seu tempo.
Simões Junior – Cadete Nr 1247- C Inf.

PEGA NA MENTIRA EM TEMPOS DE CMPV

O Boca fala pouco, já se vê
Sempre foi conceito MB
Só notícia esperta, na reunião
Na mais pura emoção
Volota é suíço de Friburgo
E eu sou ariano de Hamburgo-go-go...
 
Pega na mentira
Pega na mentira
Corta o rabo dela
Pisa em cima
Bate nela
Pega na mentira...

Mário Augusto odeia Salvador
E o Tiziu pretende ser pastor
Turma 72, em porto argentino
São mais moços que meninos
Vi o brother Pinpa no Maraca
Junto na Vasqueire com o Arataca-ca-ca...

Pega na mentira
Pega na mentira
Corta o rabo dela
Pisa em cima
Bate nela
Pega na mentira...

O Boita só defende desertor
O Lobo vai a POA com amor
Já não existe exame para a OAB
Ai, saudade da UFC
Patinho lá no IME é cientista
E o Bac agora é pianista-ta-ta...

Pega na mentira
Pega na mentira
Corta o rabo dela
Pisa em cima
Bate nela
Pega na mentira...

Dom Obá III, ouvidor e autor de doces mentiras inspiradas nas tertúlias da TuMMM/CMPV.

Rio de Janeiro, 05 Nov 2011.
Nilo

Quem não precisa?

Um dia eu estava na frente de casa secando meu carro. Eu tinha acabado de lavar o carro e esperava minha esposa para sair para o trabalho. Vi, descendo a rua, um homem que a sociedade consideraria um mendigo. Pela aparência dele, não tinha carro, nem casa, nem roupa limpa e nem dinheiro. Tem vez que você se sente generoso mas há outras vezes que você não quer nem ser incomodado. Este era um dia do "não quero ser incomodado".
- Espero que não venha me pedir dinheiro. Pensei.

Não veio. Passou e sentou-se em frente, no meio-fio do ponto de ônibus e não parecia ter dinheiro nem mesmo para andar de ônibus. Após alguns minutos falou,
- É um carro muito bonito.

Sua voz era áspera mas tinha um ar de dignidade em torno dele. Eu agradeci e continuei secando o carro.

Ele ficou lá. Quieto, sentado enquanto eu trabalhava. O previsto pedido por dinheiro nunca veio. Enquanto o silêncio entre nós aumentava, uma voz interior me dizia,
- Pergunte-lhe se precisa de alguma ajuda.

Eu tinha certeza que responderia sim mas, atendendo à insistente voz interior...
- Você precisa de ajuda? Perguntei.

Ele respondeu com três simples palavras acompanhadas de um sorriso que me deram uma sacudida.
- Quem não precisa?

Eu precisava de ajuda. Talvez não para a passagem do ônibus ou um lugar para dormir, mas eu precisava de ajuda. Peguei minha carteira e lhe dei dinheiro, não somente o bastante para a passagem do ônibus mas também para conseguir uma refeição e um abrigo.

Aquelas três palavras ainda soam verdadeiras. Não importa o quanto você tem, não importa o quanto você realizou, você também precisa de ajuda. Não importa o quão pouco você tem, não importa o quão cheio de problemas você esteja, até mesmo sem dinheiro ou um lugar para dormir, você pode dar ajuda. Mesmo que seja apenas um elogio, você pode dar.

Você nunca sabe quando poderá ver alguém que parece ter tudo mas que, na verdade, está esperando de você algo que não tem.

Talvez o homem fosse apenas um desconhecido desabrigado que vagueia pelas ruas. Talvez fosse mais do que isso. Talvez ele tenha sido enviado por uma força maior e sábia para ensinar à uma alma acomodada em si mesma.

Talvez Deus tenha olhado pra baixo, chamado um anjo, vestido-lhe como um mendigo e, a seguir, disse,
- Vá encontrar-se com aquele homem que limpa o carro, ele precisa de ajuda.

"Quem não precisa?" Frazão

Texto do Amigo Estrázulas