sábado, 26 de maio de 2012

40 ANOS, PRESENTE!!! A FORÇA DE UM IDEAL.


O coração tem suas razões, que a própria razão desconhece. A célebre frase de Blaise Pascal (1623-1662), importante matemático, físico, teólogo, filósofo e pensador francês ainda enseja interpretações, quase quatro séculos após registrada em Pensées, livro da fase terminal de vida do gênio seiscentista, à época já privilegiando os questionamentos filosóficos em detrimento dos científicos. Desta escolha existencial certamente sobreveio inspiração a eclodir na sentença imortal, válida como brevíssimo e definitivo tratado da inefável interrelação, lógica vs emoção.
Associados e não excludentes, analisem-se os desígnios do coração e da mente, pois sempre persistirá diminuto resíduo racional nas relações afetivas, mesmo nas paixões acaloradas e avassaladoras, expondo lógica invisível difícil de ser equacionada. E vice-versa, nas questões onde a razão transparece a preponderar, soberana. Se Pascal não tivesse sucumbido ao estudo de questões metafísicas, no trecho final de sua fulgurantemente curta existência, talvez a frase inaugural destas considerações jamais tivesse sido proferida.
Neste 2012, dedicado a justos festejos pelas quatro décadas de oficialato da gloriosa Turma Marechal Mascarenhas de Moraes, pressente-se indisfarçável conjunção astral propícia a satisfazer quimeras e sonhos, antes nunca visível. Cito exemplo próprio. Desde a irrupção do ano, impulsionado por súbita e indizível compulsão redacional, ouso difundir aos confrades maus poemetos, reles ensaios, banais croniquetas e discutíveis artigos de vasta miscelânea temática, habitualmente apreciada pela maioria sob ótica de generosa benevolência e até de incentivo a novas estripulias, que admito em circunstâncias outras impossíveis de serem imaginadas, ou digeridas.
Os indícios são veementes. Além dos tradicionais, intensifica-se o surgimento, ou reativação de núcleos associativos na imensidão do País, embalados no mote genial “onde houver ½ cadete de 72, lá estará o espírito da Turma”. O sítio eletrônico www.tummm72.com.br, alçou vôo solo a altitudes estratosféricas, consolidou-se como portal de notícias, intercâmbio de informações e contatos no universo da Nação 72, dando margem a retomar-se amizades de longa data apartadas. Há dias, ao questionar a reiterada ausência de confrade às assembleias aqui no Rio, embora trabalhe no entorno da Praia Vermelha, justificou-se ele de imediato assegurando que “nos encontraremos em Resende, no fim do ano”. Quer dizer, o companheiro esnoba, ou não consegue adentrar o CMPV, mas sem dúvida comparecerá ao PTM em dezembro, sobretudo, digo eu, encantado pela magia insuperável da casa-matriz de nossos sonhos da juventude: a Academia Militar das Agulhas Negras.
E exatamente à nossa estimada AMAN dedico este arroubo textual despretensioso e sincero. Meca de peregrinações periódicas, mesmo daqueles que por uma simples jornada nela abrigaram nobres ideais da juventude, exerce sobre os especiais rebentos de suas gerações e turmas fascínio singular, revitalizado em cada retorno ao santuário indestrutível. Nada há que supere nos corações de seus ex-inquilinos a emoção de reencontrá-la, na revivência de expectativas felizes marcadas pelo convívio fraterno de amigos ali para sempre conquistados. Julgo, portanto razoável esteja a aproximação do 16 de dezembro a provocar peculiar taquicardia na Turma, principalmente motivada por lembranças recorrentes e tudo nelas simbolizado. No entanto, a Academia, uma de nossas lídimas razões do coração, também nos consagra afetos derivados da razão. Ao refletir, intento externar alguns deles.
A criação da AMAN, é sabido, teve fulcro no idealismo, devotamento missionário e visão estratégica de ser humano formidável: o Marechal José Pessôa Cavalcanti de Albuquerque. Sem ele, seu pioneirismo, liderança e amor ao Exército, a história da formação dos oficiais da Força Terrestre, no século XX, possívelmente seria mais acanhada e desprovida do ideário de grandeza já notório na monumentalidade arquitetônica da escola militar de Agulhas Negras; para melhor dissecar-lhe as origens, indispensável se torna a leitura de obra recentemente reeditada pela BibliEx, Marechal José Pessôa, a Força de Um Ideal, clássico militar de historiador renomado, o Coronel Hiram de Freitas Câmara.
A Academia, em sua gênese, expressa afinidade inquebrantável com a destinação análoga de suas antecessoras, desde a fundadora Real Academia de Artilharia, Fortificações e Desenho, sediada na Casa do Trem de Artilharia, no final do século XVIII, até a de anterior proximidade, a Escola Militar do Realengo; a esta, deve as turmas iniciais de cadetes, tradições, costumes e, acima de tudo, a própria razão de existir, nas formulações e ações desbravadoras do comandante da Escola, entre 1931 e 1934, o então coronel José Pessôa. De fato, numa sucessão de inovações de pronto consolidadas, típicas do caráter empreendedor de personalidade ímpar, o brilhante oficial de Cavalaria delineou a futura Academia na Escola do Campo de Marte do subúrbio carioca.
Revalorizou o título de cadete, marginalizado por intensa pregação positivista dominante no alvorecer da era republicana, acusando-o de aristocrático. Deu vida ao Corpo de Cadetes; renovou os processos de admissão, recrutamento, matrícula e as grades curriculares; modernizou as instalações, incluindo a construção de novo estádio, cassinos e refeitórios compatíveis com a dignificação social dos futuros chefes castrense; recriou os uniformes; criou o brasão das armas e o símbolo-mór do cadete e da Honra Militar: o Espadim de Caxias. Estas e tantas outras iniciativas subsidiavam a meta de se forjar nova mentalidade na formação dos quadros dirigentes do Exército, afinada com a atmosfera reformadora da recém-nomeada Segu nda República. Assim como exercera papel relevante na introdução dos blindados na Força Terrestre, e décadas adiante exerceria no planejamento da construção de Brasília, o incansável coronel Pessôa seria o grande impulsionador do despontar da AMAN a partir do autêntico laboratório em que, sob seu comando, a Escola Militar do Realengo se transformara.
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Idealizado na essência, intramuros do Realengo, o Cadete de Caxias viria corporificar-se na plenitude em Resende. Nas conexões afetivas de outra realidade sócio-escolar e nas razões objetivas do coração, diante de ambiência física sedutora e deslumbrante. Sobreviveriam os laranjeiras, atrelados à Academia como a fragrância onipresente das laranjeiras fincadas no solo de Realengo; de igual sorte os percevejos, pregados nas camas dos alojamentos até nas férias e dias de folga, elos de transição singela com a antiga Escola, sob novo cenário. Recorrendo a Pascal, há momentos em que as razões do coração irremediavelmente se submetem aos ditames da razão em si mesma.
Estreitar o conhecimento da AMAN, suas raízes, antecedentes históricos e atualidade, colabora para reforçar os pilares da razão perante a fortaleza inexpugnável da nossa profunda afeição. Contribui para melhor compreender o dinamismo extraordinário de um Soldado na superior acepção da palavra, o Marechal José Pessôa Cavalcanti de Albuquerque, que legou aos cadetes das gerações vindouras o ensinamento maior da força de um ideal, ao qual devem especial devoção e que, quarenta anos depois ainda emociona e faz cada eterno cadete da Turma Marechal Mascarenhas de Moraes bradar, a plenos pulmões: Quarenta Anos, Presente!!!

Rio, 26 de maio de 2012.

Cadete 1039, Nilo, de Cavalaria e Aspirante da Turma de 1972.

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